
Sentou-se no banco, o corpo pequeno, dorido ainda do frio da noite e do degrau cama.
Olhou a rua colorida de natal, e desejou ser grande, ter mãos que carregassem presentes, e sorrisos à espera numa casa natal cheia de calor, e não ser assim pequeno, o corpo dorido do frio, as mãos vazias de sonhos.
O rosto foi-se fechando, ficando duro e adulto enquanto a avenida se enchia de mãos que carregavam presentes, de mãos que puxavam filhos, de filhos que apontavam montras onde estava o natal e diziam, "Olha mãe."
Mãe, disse ele baixinho ensaiando a palavra.
Mãe, disse ele sentindo a estranheza da palavra.
Mãe, disse ele zangando, sabendo da inutilidade da palavra.
E levantando-se de repente do banco, correu, e sem olhar roubou um saco que uma mão de mãe carregava.
Escondeu-se no degrau-cama e apertou com força nas asas do saco, a mão da mãe e os natais que nunca tivera.
José viu ainda ao sentar-se no mesmo banco, o miúdo que fugia e a senhora que gritava, agarra que é ladrão.
Sentiu o sol que lhe aquecia o rosto enrugado, tão enrugado e já sem idade, tão enrugado que já sem filhos para dar presentes.
- Cada um tem a sua vida, pensou, cada um tem o seu natal.
E lembrou-se do rosto de cada um deles, grandes e pequenos, recebendo presentes e dizendo pai, recebendo presentes e dizendo avô.
Até que o rosto perdeu a idade e o corpo perdeu a firmeza, e com ela os filhos e os netos que hoje tinham natais aos quais ele não pertencia.
Era já um estranho para quem ele amava.
Morto já, na lembrança de quem amava.
Sentiu frio ao olhar a avenida colorida de natal.
Lentamente, levantou-se.
Caminhou atrasando os passos, para a casa fria a que chamavam lar.
Para a casa-lar onde se guardam as pessoas sem idade, sem rosto e sem natal.
Como ele.
Marília viu o banco ensolarado que José abandonara, e deixou cair nele corpo e solidão.
- Como odeio gente feliz, pensou olhando a avenida colorida de natal.
Odiou-se por sentir ciúmes da felicidade alheia.
Odiou-se por não ser uma daquelas pessoas que entravam e saíam das lojas, com outras pessoas e prendas a dar no pensamento.
Fechou os olhos e sentiu o sol, as lágrimas e o desejo de não ser ela.
Lembrou-se dos natais passados, de sonhos perdidos pelas ruas da cidade, de sonhos pisados como o rosto dela escondido atrás de uns óculos escuros.
Sabia-se invisível no meio da multidão.
Sabia, que uma multidão feliz é o melhor local para se proteger dos olhares.
Para se esconder.
Parára para ganhar um tempo.
A noite caía, Marília levantou-se.
Olhou em volta. Escolheu um rumo qualquer, uma calçada qualquer, uma rua qualquer.
Adiava o momento de voltar a casa.
Medo de voltar à casa onde as paredes eram solidão. Onde o medo era lugar.
Noite…
Um bebâdo da cidade com chapéu de Pai Natal, percorria como um fantasma a avenida deserta e colorida.
De pé no mesmo banco, abriu os braços e começou a cantar:
“ Noite feliz. Noite de amor…”
Encandescente
Olhou a rua colorida de natal, e desejou ser grande, ter mãos que carregassem presentes, e sorrisos à espera numa casa natal cheia de calor, e não ser assim pequeno, o corpo dorido do frio, as mãos vazias de sonhos.
O rosto foi-se fechando, ficando duro e adulto enquanto a avenida se enchia de mãos que carregavam presentes, de mãos que puxavam filhos, de filhos que apontavam montras onde estava o natal e diziam, "Olha mãe."
Mãe, disse ele baixinho ensaiando a palavra.
Mãe, disse ele sentindo a estranheza da palavra.
Mãe, disse ele zangando, sabendo da inutilidade da palavra.
E levantando-se de repente do banco, correu, e sem olhar roubou um saco que uma mão de mãe carregava.
Escondeu-se no degrau-cama e apertou com força nas asas do saco, a mão da mãe e os natais que nunca tivera.
José viu ainda ao sentar-se no mesmo banco, o miúdo que fugia e a senhora que gritava, agarra que é ladrão.
Sentiu o sol que lhe aquecia o rosto enrugado, tão enrugado e já sem idade, tão enrugado que já sem filhos para dar presentes.
- Cada um tem a sua vida, pensou, cada um tem o seu natal.
E lembrou-se do rosto de cada um deles, grandes e pequenos, recebendo presentes e dizendo pai, recebendo presentes e dizendo avô.
Até que o rosto perdeu a idade e o corpo perdeu a firmeza, e com ela os filhos e os netos que hoje tinham natais aos quais ele não pertencia.
Era já um estranho para quem ele amava.
Morto já, na lembrança de quem amava.
Sentiu frio ao olhar a avenida colorida de natal.
Lentamente, levantou-se.
Caminhou atrasando os passos, para a casa fria a que chamavam lar.
Para a casa-lar onde se guardam as pessoas sem idade, sem rosto e sem natal.
Como ele.
Marília viu o banco ensolarado que José abandonara, e deixou cair nele corpo e solidão.
- Como odeio gente feliz, pensou olhando a avenida colorida de natal.
Odiou-se por sentir ciúmes da felicidade alheia.
Odiou-se por não ser uma daquelas pessoas que entravam e saíam das lojas, com outras pessoas e prendas a dar no pensamento.
Fechou os olhos e sentiu o sol, as lágrimas e o desejo de não ser ela.
Lembrou-se dos natais passados, de sonhos perdidos pelas ruas da cidade, de sonhos pisados como o rosto dela escondido atrás de uns óculos escuros.
Sabia-se invisível no meio da multidão.
Sabia, que uma multidão feliz é o melhor local para se proteger dos olhares.
Para se esconder.
Parára para ganhar um tempo.
A noite caía, Marília levantou-se.
Olhou em volta. Escolheu um rumo qualquer, uma calçada qualquer, uma rua qualquer.
Adiava o momento de voltar a casa.
Medo de voltar à casa onde as paredes eram solidão. Onde o medo era lugar.
Noite…
Um bebâdo da cidade com chapéu de Pai Natal, percorria como um fantasma a avenida deserta e colorida.
De pé no mesmo banco, abriu os braços e começou a cantar:
“ Noite feliz. Noite de amor…”
Encandescente

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